Achados Econômicos

Remessa de lucros e juros geram rombo recorde em transações com exterior

Sílvio Guedes Crespo

dolar Lee Jae-Won Reuters

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O Brasil teve um deficit de US$ 11,6 bilhões nas suas transações com o exterior em janeiro. Trata-se de um rombo 2% maior que o registrado em igual período do ano passado (US$ 11,4 bilhões) – que, por sua vez, era o mais alto desde pelo menos 1980, quando o Banco Central começou a divulgar mensalmente esse levantamento.

Os números se referem à diferença entre o dinheiro que entrou e o que saiu do país na forma de comércio de bens, serviços e rendas.

Esse saldo negativo foi compensado pela entrada de US$ 14 bilhões na forma de investimento estrangeiro – tanto os aportes no setor produtivo quanto no mercado financeiro. Com isso, as reservas internacionais cresceram quase US$ 3 bilhões.

transacoes correntes usd

 

O gráfico mostra o saldo em dólares das transações com o exterior. Mais importante que isso, no entanto, é o saldo como proporção do PIB (produto interno bruto). Porque se o deficit sobe em ritmo igual ao PIB, então não há deterioração das contas externas.

Pelo critério de porcentagem do PIB, o deficit em conta corrente não é recode. Ficou em 3,7%, muito perto de atingir os 4% registrados de 1999 a 2002, que foi o pior momento das contas externas da história recente do país.

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Rombo nas transações correntes

Nos três principais itens em que o BC divide as transações correntes (comércio de bens, mercado de serviços e pagamentos de renda), o país está com saldo negativo.

O item “rendas” foi o que apresentou maior deficit, de US$ 4,4 bilhões – um aumento de US$ 500 milhões em comparação com janeiro do ano passado.

Isso ocorreu porque saíram do país R$ 2,5 bilhões na forma de remessas de lucros das empresas às suas matrizes no exterior e mais US$ 1,9 bilhão como pagamento de juros das companhias nacionais a bancos estrangeiros.

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O segundo item que mais gerou deficit foi a balança comercial. As importações de bens superaram as exportações em US$ 4,1 bilhões, resultado um pouco maior que o do ano passado (US$ 4 bilhões).

Nas transações de serviços, o houve um deficit de US$ 3,4 bilhões. Esse rombo resultou da nossa forte dependência de aluguel de equipamentos estrangeiros, atividade que gerou a saída de US$ 1,6 bilhão do país. Outro motivo foram os gastos de turistas no exterior, que superaram em US$ 1,5 bilhão as despesas de visitantes estrangeiros no Brasil.

A conta de transações correntes inclui, também, mais um item, que o BC chama de “transferências unilaterais” – dinheiro que os brasileiros que moram no exterior mandam para suas famílias aqui, e vice-versa. Mas o volume é muito pequeno e não faz diferença para o rombo das contas externas.

Investimento e especulação

A saída de US$ 11,6 bilhões do país por meio das nossas transações com o resto do mundo foi compensada pela entrada de US$ 14,1 bilhões na forma de investimentos estrangeiros.

O dinheiro que as multinacionais colocaram no setor produtivo brasileiro – os chamados investimentos diretos – gerou uma entrada líquida de US$ 5 bilhões no país. Esse é um capital de boa qualidade, porque gera empregos e não pode sair do país rapidamente. Uma empresa não consegue vender uma fábrica tão rápido quanto o faz com ações ou títulos de renda fixa.

O ideal seria se, sozinho, o investimento direto conseguisse cobrir todo o rombo das transações correntes, de US$ 11,6 bilhões.

Mas como a entrada de investimento produtivo foi de somente US$ 5 bilhões, o país precisou contar com mais US$ 4 bilhões na forma de investimentos em carteira e em derivativos. Ou seja, dinheiro que vem para o mercado financeiro e pode rapidamente deixar o país.

Ainda, o BC registra que entraram outros US$ 5 bilhões no país na forma de “outros investimentos”, que incluem algumas formas de empréstimos para empresas brasileiras e outros itens.