Análise: indústria deixa fundo do poço, mas retomada é incerta
Sílvio Guedes Crespo
A produção industrial tem se comportado na forma de uma montanha russa nos últimos meses, alternando momentos de alta e de baixa.
O setor teve queda de 2% em julho, depois de ter registrado desempenho negativo em fevereiro e maio, e positivo em março, abril e junho.
O segmento que mais contribuiu para a queda em julho, o de veículos, é um dos mais instáveis. Despencou 9,5% em fevereiro, cresceu nos dois meses seguintes (8,2% e 8%, respectivamente), voltou a cair em maio, subiu em junho e recuou novamente em julho.
O farmacêutico, o segundo ramo com maior impacto negativo no índice geral da indústria em julho, também tem variado para cima e para baixo. Subiu 10% em junho e caiu 10,7% em julho, após alternar entre resultados positivos e negativos em meses anteriores.
Para evitar um olhar míope sobre a indústria brasileira neste momento de instabilidade, é recomendável observar também o desempenho em prazos maiores. Abaixo, veremos os resultados acumulados em 12 meses, sempre em relação a igual período do ano anterior.
Nesse tipo de comparação, nota-se que a indústria brasileira acabou de sair de um ciclo de baixa e entrou em uma fase de leve alta, como indica o gráfico. A consistência dessa retomada, no entanto, é incerta.
O gráfico mostra que o ciclo de baixa mais recente da indústria começou na passagem de 2011 para 2012 e viu o fundo do poço em setembro do ano passado (-2,9%). Em junho de 2013, registrou uma leve alta (0,3%), mantida no mês seguinte (0,6%).
A boa notícia é que o setor que puxou para baixo o resultado de julho apresentou melhora quando se observam os resultados acumulados em 12 meses.
A produção de veículos, que foi muito mal no ano passado (queda de 13,6%), reduziu sua queda aos poucos ao longo de 2013, de modo que passou a apresentar alta de junho (1,7%) e julho (3,3%).
Outro ponto positivo está no segmento de máquinas e equipamentos, que registrava forte queda no início do ano (-4,1% nos 12 meses encerrados em janeiro) e depois reduziu as perdas, passando a ter leve alta também a partir de junho.
O ramo de alimentos também diminuiu a queda, porém, sem ainda começar a crescer.
Mas essa análise de prazo um pouco mais longo também traz más notícias. Considerando sempre o acumulado de 12 meses, dois segmentos que mostram grande dificuldade, e põe em dúvida a retomada da indústria brasileira, são o extrativo e o têxtil.
Este último não parou de encolher desde fevereiro de 2011. Um consolo é que as taxas de queda já foram piores. Estavam em torno de -15% na passagem de 2011 para 2012 e agora, em 2013, passaram a variar ao redor de -3%.
Dado esse grande período de retração, não se pode esperar que empresários invistam firmemente no ramo nos próximos meses, mesmo com a desvalorização do real, que encarece os tecidos importados.
Outro setor em dificuldade, o extrativo, mostrou que vai de mal a pior. Registrou uma ligeira alta de 1,8% em março, mas desde então passou a cair, e cada vez com maior intensidade, chegando a -3,7% em julho.
Com importantes ramos da indústria caminhando em direções opostas (o de veículos com sinais de recuperação, e o extrativo e outros com indicações de piora), e ainda com as incertezas na economia internacional, o futuro da indústria permanece incerto. Se o fundo do poço ficou para trás no segundo semestre do ano passado, como mostra o gráfico acima, não há sinais de que a retomada seja duradoura.
Tanto que diversos analisas econômicos, depois de terem sido pessimistas demais nas estimativas para o PIB (produto interno bruto) do segundo trimestre, erraram também as projeções para a indústria – só que, desta vez, por serem otimistas demais.
A estimativa mediana para a variação da produção industrial de junho para julho, segundo 21 especialistas consultados pela agência Reuters, era de uma queda de 1,2%. O resultado oficial foi uma retração ainda maior, de 2%.