Brasil perde reservas internacionais pela primeira vez desde 2000
Sílvio Guedes Crespo
Atualizado às 13h46*
O Brasil interrompeu, no ano passado, sua trajetória de acúmulo de reservas cambiais internacionais que já durava mais de uma década.
Pela primeira vez desde 2000, o montante em moeda estrangeira ou títulos públicos de países ricos que o governo brasileiro mantém em seu poder diminuiu.
O país perdeu US$ 5,9 bilhões em reservas em 2013 (gráfico abaixo). O número é pequeno em comparação com os US$ 313 bilhões que o Brasil acrescentou ao seu cofre ao longo de 12 anos. Mesmo assim, a perda não é desprezível porque marca o fim de um ciclo.
Os dados fazem parte do balanço de pagamentos divulgado nesta sexta-feira pelo Banco Central.
Entenda
As reservas são o dinheiro que o país guarda quando a entrada de moeda estrangeira supera a saída.
A perda de reservas no ano passado ocorreu porque os gastos dos brasileiros com bens e serviços estrangeiros aumentaram e não foram compensados por uma elevação equivalente das exportações nem dos investimentos vindos do exterior.
As importações de bens atingiram US$ 239,6 bilhões, ou US$ 16,8 bilhões a mais do que em 2012. Do outro lado, as exportações ficaram praticamente estáveis, em US$ 242,2 bilhões.
Assim, a balança comercial, que é a diferença entre exportações e importações, despencou de US$ 19,4 bilhões, em 2012, para US$ 2,6 bilhões, no ano passado.
BALANÇA COMERCIAL (em US$ bi)*
Item | 2012 | 2013 |
Exportações | 242,6 | 242,2 |
Importações | -223,2 | -239,6 |
Saldo | 19,4 | 2,6 |
- Fonte: Banco Central
- * Números negativos indicam saída de dinheiro do país
Já a balança de serviços e rendas, que inclui os gastos dos brasileiros com serviços estrangeiros (por exemplo, em viagens internacionais) e também com pagamento de juros e salários, teve um deficit de US$ 87,3 bilhões no ano passado, contra US$ 76,5 bilhões em 2012.
BALANÇA DE SERVIÇOS E RENDAS (US$ bi)*
Item | 2012 | 2013 |
Receita de brasileiros com serviços no exterior | 39,9 | 39,1 |
Receita de estrangeiros com serviços no Brasil | -80,9 | -86,6 |
Receita de brasileiros com rendas no exterior | 10,9 | 10,1 |
Receita de estrangeiros com rendas no Brasil | -46,3 | -49,8 |
Saldo | -76,5 | -87,3 |
- Fonte: Banco Central
- * Números negativos indicam saída de dinheiro do país
As transferências que os brasileiros no exterior fazem para suas famílias no Brasil subiram 18% e somaram US$ 3,4 bilhões, o que representa a entrada de US$ 518 milhões a mais do que em 2012. Só que essa entrada é pequena demais para fazer alguma diferença.
Desse modo, a conta de transações correntes, que reúne a balança comercial, a balança de serviços e renda e as transferências teve no ano passado um rombo de US$ 81,4 bilhões, o maior desde que o país começou a fazer esse registro, em 1947.
CONTA DE TRANSAÇÕES CORRENTES (US$ bi)*
Item | 2012 | 2013 |
Balança comercial | 19,4 | 2,6 |
Balança de serviços e rendas | -76,5 | -87,3 |
Transferências unilaterais | 2,8 | 3,4 |
Saldo | -54,2 | -81,4 |
- Fonte: Banco Central
- * Números negativos indicam saída de dinheiro do país
O resultado das transações correntes tem sido deficitário nos últimos anos, mas esse saldo negativo vinha sendo coberto pelo forte aumento dos investimentos estrangeiros no país.
Até o ano passado, a entrada de capital externo para projetos de longo prazo era mais do que suficiente para compensar todo o dinheiro que saía na forma de transações correntes.
No primeiro semestre, no entanto, o deficit na conta corrente, que já vinha subindo, atingiu um ponto em que os investimentos estrangeiros diretos, ou seja, no setor produtivo, passaram a não dar mais conta. A partir daquele momento, o país passou a depender de capital de curto prazo, conforme este blog notou à época.
O que os últimos dados da balança comercial mostram é que, em 2013 como um todo, nem mesmo o capital especulativo foi suficiente para cobrir o déficit das transações correntes.
Os investimentos estrangeiros diretos caíram de US$ 65,3 bilhões para US$ 64 bilhões. Somando a isso os US$ 3,5 bilhões que as companhias brasileiras receberam de suas filiais no exterior, tivemos US$ 67,5 bilhões entrando no país na forma de investimentos empresariais.
O país registrou, ainda, uma entrada líquida de US$ 5 bilhões na forma de investimentos de curto prazo, como aplicações na Bolsa de Valores, em títulos da dívida do governo e outros.
Mais US$ 1,2 bilhão entrou como transferência unilateral entre empresas (por exemplo, quando uma companhia sediada nos EUA manda dinheiro para sua filial no Brasil, sem exigir nada em troca).
Dessa forma, os investimentos estrangeiros totais somaram US$ 73,8 bilhões.
INVESTIMENTOS INTERNACIONAIS (US$ bi)*
Item | 2012 | 2013 |
De longo prazo (investimento direto) | 68,1 | 67,5 |
De curto prazo (investimento em ações, títulos etc.) | 3,8 | 5,0 |
Transferências unilaterais (a chamada 'conta de capital') | -1,9 | 1,2 |
Saldo | 70,0 | 73,8 |
- Fonte: Banco Central
- * Números negativos indicam saída de dinheiro do país
Temos, também, os dados que foram registrados de forma errada e por isso não entraram em nenhum dos itens do balanço de pagamentos aqui citados. Os erros e omissões somaram uma entrada de US$ 1,7 bilhão.
Assim, colocando tudo na conta, saíram do país US$ 81,4 bilhões por meio das transações correntes e entraram US$ 73,8 bilhões como investimentos estrangeiros e mais US$ 1,7 bilhão que não se sabe como (erros e omissões), o que significou um balanço de pagamentos negativo em (ou uma perda de reservas de) US$ 5,9 bilhões.
BALANÇO DE PAGAMENTOS (US$ bi)*
Item | 2012 | 2013 |
Transações correntes | -54,2 | -81,4 |
Investimentos internacionais | 70,0 | 73,8 |
Erros e omissões | 3,1 | 1,7 |
Saldo (variação das reservas) | 18,9 | -5,9 |
- Fonte: Banco Central
- * Números negativos indicam saída de dinheiro do país
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