Em 20 anos de real, salário mínimo subiu 142% acima da inflação
Sílvio Guedes Crespo
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O salário mínimo no Brasil acumulou um ganho de 142% acima da inflação desde julho de 1994, quando o real começou a circular, até junho de 2014.
Naquela época, o mínimo foi definido em R$ 64,79. Hoje, está em R$ 724, o que significa uma alta de R$ 1.017% no período. Enquanto isso, o indicador oficial de inflação (IPCA, Índice de preços ao Consumidor Amplo) subiu 362%. O resultado foi um aumento real de 142% no salário mínimo.
Caso tivesse sido apenas corrigido pelo IPCA ao longo desses anos, o mínimo hoje estaria em R$ 299.
O gráfico abaixo mostra a evolução do salário mínimo nominal e como ele estaria de fosse reajustado pelo índice oficial de preços a cada ano.
Para tornar as coisas um pouco menos abstratas, podemos recorrer à pesquisa da cesta básica do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos).
Segundo a instituição, a cesta básica custava R$ 67,40 na cidade de São Paulo em julho de 1994. Hoje, está R$ 354,63.
Isso quer dizer que quem ganhava o salário mínimo naquela época conseguia comprar, no máximo, uma cesta básica. Hoje, quem recebe o mínimo adquire duas cestas.
Índice de inflação
Sempre que cito algum índice de inflação neste blog, uma pequena e barulhenta parte dos leitores vem dizer que os dados não batem com o que eles veem no supermercado. Curiosamente, nenhum deles traz alguma informação precisa. Dizem sempre de forma genérica coisas do tipo: ''A carne subiu muito mais do que isso''; ''Não é isso que eu vejo no mercado'' etc.
A essas pessoas que tentam impor ideias apenas na base do ''caps lock'', ofereço três argumentos.
O primeiro é o de que os índices de inflação do setor privado trazem números muito próximos aos dos indicadores oficiais. O IPC-DI, por exemplo, é um índice de preços ao consumidor da Fundação Getulio Vargas (FGV) que registrou uma alta de 6,5% nos últimos 12 meses, exatamente o mesmo número apresentado pelo IPCA, do governo. Já o IGP-M, também da FGV, marcou 6,2%. Ainda, o IPC da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisa Econômica), entidade ligada à USP, registrou alta de 5,07% em São Paulo. No ICV, do Dieese, o aumento do custo de vida foi de 6,2%.
Situação bem diferente acontece na Argentina, onde os índices calculados pelo setor privado dão um resultado duas ou até três vezes maior do que os números oficiais. Se o IBGE está manipulando os dados de inflação, então ele combinou direitinho com a FGV, com a Fipe e com o Dieese.
O segundo argumento é o de que as pessoas que tomam decisões de negócios usam essas estatísticas. Relatórios de bancos citam abundantemente números do IBGE. Refiro-me a análises econômicas que grandes instituições financeiras oferecem aos seus clientes para ajudá-los a decidir onde investir. Ou seja, antes aplicar seus milhões, investidores olham para dados do governo, entre outros. Essas pessoas não são ingênuas e não tomariam uma decisão de investimento com base em estatísticas que não fossem confiáveis.
O terceiro e último argumento é o de que é possível checar os números. No caso do Dieese, que foi citado neste post, é mais fácil porque ele divulga o preço dos produtos encontrados.
Por exemplo, o instituto diz que a carne em São Paulo está R$ 19,61 o quilo. Para a pesquisa da cesta básica, o valor usado é a média entre o coxão mole e outros dois cortes de preço parecido. Pois bem, fazendo uma busca por ''coxão mole'' rapidamente no site do Pão de Açúcar, vejo que o quilo está R$ 18,99 – mais barato, portanto, do que o apontado pelo Dieese.
Já o leite longa vida integral está R$ 3,14 em São Paulo, segundo o Dieese. No site do Pão de Açúcar, a marca mais barata (Parmalat) sai por R$ 2,85, e a mais cara (Ninho Nestlé), por R$ 3,95. O número do Dieese, desse modo, está dentro da faixa. Outro exemplo: o feijão carioca está R$ 4,01 o quilo, de acordo com a pesquisa. No Pão de Açúcar, está R$ 3,55 o mais barato (Qualitá) e R$ 4,79 o mais caro (Broto Legal).
Enfim, não é tão difícil checar se os índices de inflação estão corretos, mas dá trabalho. É preciso ir aos supermercados, por exemplo, no próximo 1º de agosto e anotar o preço de todos os itens que são pesquisados pelos institutos (no caso do IBGE, a lista está aqui). Depois, é só voltar aos mesmos estabelecimentos no dia 1º dos meses seguintes e ver qual foi a variação. Quanto mais mercados a pessoa visitar, e quanto mais espalhados eles estiverem, mais consistência os dados terão.
Os que têm certeza de que o IBGE, a FGV, a Fipe e o Dieese estão manipulando os índices podem dar uma grande contribuição ao país se fizerem esse exercício.