Achados Econômicos

Dilma poupa menos que Lula e mais que FHC para pagar juros

Sílvio Guedes Crespo

Atualizado às 9h28*

Lula, Dilma e FHC ao embarcar para o velório de Mandela, em dezembro

Lula, Dilma e FHC antes de embarcar para o velório de Mandela, em dezembro

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Com ou sem truques contábeis, nos três primeiros anos do governo Dilma Rousseff as contas do país ficaram menos equilibradas do que no período do seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, e mais do que no tempo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Se avaliarmos desde Fernando Collor de Mello, o período em que o país manteve suas contas públicas mais equilibradas foi o de Lula, seguido por Itamar Franco, Dilma, FHC e, por último, Collor.

Esse ranking é confirmado tanto pelos dados que o governo anuncia quanto pelos números que neutralizam a prática conhecida como “contabilidade criativa” – o uso de medidas não convencionais para inflar o registro das receitas e reduzir o das despesas.

Em 2013, o governo federal e o Banco Central reservaram R$ 75 bilhões de suas receitas (inclusive as extraordinárias) para pagar juros, o que equivale a 1,6% do PIB (produto interno bruto). Na média dos três anos de Dilma, a proporção ficou em 1,9% do PIB.

Nos oito anos de Lula, a média foi de em 2,2% (sendo 2,4% no primeiro mandato e 2% no segundo). No período FHC, foi de 1,1% (0,3% no primeiro e 1,9% no segundo). Com Itamar, a proporção ficou em 2%, e com Collor, 1%.

superavit primario por presidente 1

Deve-se notar, porém, que, desde 1999, quando foram criadas as metas, o superavit primário vinha caminhando bem, sempre em torno de 2%, 3% ou mais, o que possibilitou diminuição da dívida como proporção do PIB. No governo Dilma, no entanto, o superávit primário recuou para menos de 2% do PIB, o que não ocorria desde 1998.

supravit primario historico

‘Contabilidade criativa’

Nos últimos anos, o governo tem sido criticado por antecipar receitas para aumentar o superávit primário. Por exemplo, as estatais iriam pagar dividendos ao Tesouro em 2013, mas o governo decidiu que elas antecipassem o pagamento para dezembro do ano anterior, de modo que as contas ficassem equilibradas nas planilhas de 2012.

Além disso, não entram na conta os gastos do governo com empréstimos subsidiados, observa o economista Felipe Salto, da Tendências Consultoria Integrada. “É por meio da contabilização das receitas [antecipadas de dividendos] e da não contabilização dos subsídios das operações do BNDES, por exemplo, que o Tesouro fabricou os montantes elevados de dividendos nos últimos anos”, afirma (leia entrevista mais abaixo).

Desse modo, ele calcula o Primário Efetivo Tendências (PET), série de dados que mostra qual seria o superávit primário do setor público se o governo não antecipasse dividendos nem deixasse de contabilizar os empréstimos subsidiados.

O PET desconta, ainda, a receita de R$ 32 bilhões que o Tesouro teve com a Petrobras em 2010. Naquele ano, a estatal pagou R$ 75 bilhões ao governo, que, em contrapartida, colocou R$ 43 bilhões na companhia para manter-se como sócio majoritário após a capitalização da petrolífera.

pet

Pela série PET, o superávit primário médio do setor público durante o governo Dilma cai de 2,5% para 2,1% do PIB. Já no período Lula, desce de 3,2% para 3%. Esses dados se referem às contas da União, Estados, municípios e estatais. O PET não tem uma série apenas para o governo federal.

Outra crítica à política atual se refere ao uso de receitas extraordinárias para fazer superávit primário, como as concessões de infraestrutura, os leilões do pré-sal e o Refis, programa que deu desconto para as empresas quitarem antecipadamente suas dívidas com a União.

A analista de finanças públicas Vilma da Conceição Pinto, da Fundação Getulio Vargas, calculou o esforço fiscal do setor público, ou seja, quanto foi reservado dos impostos para pagar juros. Como Salto, da Tendências, ela descontou as antecipações de dividendos e o pagamento da Petrobras. A diferença é que ela retirou, também, as receitas extraordinárias com concessões, outorgas e Refis, conforme o gráfico abaixo.

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De acordo com esse cálculo, o setor público fez um esforço fiscal de apenas 1,6% do PIB durante o governo Dilma e de 2,9% no período Lula. A série se inicia em 1997, de modo que não se pode calcular a média de todo o governo FHC. Nos seis anos disponíveis (1997-2002), o esforço fiscal foi de 1,5% do PIB.

Entrevista

O economista Felipe Salto, da Tendências, deu a seguinte entrevista a este blog.

Sílvio Crespo: O governo FHC fez um esforço fiscal menor do que o governo Dilma. Por que, então, as críticas de que ela está sendo mais leniente com esse problema?

Felipe Salto: São dois momentos diferentes. Em primeiro lugar, as metas anuais de superavit primário só vieram em 1999. Então, você pode comparar os dois períodos (Dilma e FHC), mas tem que fazer essa ressalva.

SC: Por quê?

O ponto é: naquele momento, era possível gerar um superavit primário de 3% do PIB? Com crescimento baixo, sem regras anuais, sem a renegociação da dívida dos Estados, não havia condições. A Lei de Responsabilidade Fiscal é de maio de 2000. Antes disso, não tínhamos condições.

O que dá para criticar é que as metas de superavit primário poderiam ter sido estabelecidas desde 1994. Naquela época já se sabia que, mesmo controlando a inflação inercial, seria necessário controlar a parte fiscal.

SC: Como o senhor vê a situação atual?

FS: Hoje, a crítica é outra. Uma vez que já existia um regime funcionando, o governo abandonou essas regras e não colocou nada no lugar.

O custo da dívida está aumentando a todo vapor. As taxas bateram quase 7%, mesmo nos títulos mais longos. O mercado está dizendo: ‘Esse regime fiscal novo é pior. Gera um esforço fiscal menor’.

Opinião

Dilma abandonou um regime que estava dando certo, como disse Felipe Salto.

Não faltam sinais de que a ''nova matriz econômica'' não deu frutos. Durante o atual governo, o PIB desacelerou, a inflação aumentou, as contas externas pioraram, a indústria encolheu e os juros voltaram a subir. O modelo precisa mudar.

Isso posto, não custa lembrar um pouco do nosso passado. FHC, um defensor da responsabilidade fiscal, enfrentou uma situação interna e externa adversa durante o seu governo. Mas, no seu primeiro mandato, quando o superavit primário federal foi de apenas 0,3% do PIB, o presidente tinha também outro objetivo muito claro: convencer o Congresso a aprovar a reeleição.

De 1991 até hoje, o único ano em que o governo federal não conseguir fazer superavit primário foi 1997, quando a emenda da reeleição passou no Legislativo.

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